Lil Yachty lança novo álbum, Let’s Start Here.
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Review: Lil Yachty – Let’s Start Here.

Existe uma frase de Bob Ross, pintor mundialmente famoso e apresentador do programa The Joy of Painting que consegue resumir um pouco da ousadia na arte: “There are no mistakes, only happy accidents” (Não existem erros, mas acidentes felizes).

Em suma, essa frase sintetiza Let’s Start Here., quinto álbum do rapper Lil Yachty. Afinal, ainda que esse não seja um disco perfeito, é um trabalho permeado de momentos bonitos e grandiosos que surpreende o ouvinte.

Citando a ousadia do começo do texto, Let’s Start Here se mostra ambicioso se analisarmos a fundo quem é o dono dessa obra. Antes de mais nada, Yachty sempre foi visto como um rapper que se limita a beats simples e versos que flertam com o niilismo e o humor. Assim, dá pra dizer que Yachty nunca foi enxergado como um artista respeitado – e esse respeito é o seu objetivo com o novo álbum.

Por outro lado, essa busca por uma virada de chave do rapper de Atlanta é consciente, representada pela própria capa – pessoas vestidas de executivos e com os rostos distorcidos, com um sorriso sombrio, como uma representação desse sentimento de ser subestimado que Lil Yachty nutri. Dessa forma, temos em Let’s Start Here novas faces do artista, que flutua pelo trap, psicodelia, funk e rock dos anos 70.

Lil Yachty busca mais respeito com Let’s Start Here. [Créditos: JamBase]

Essa viagem por ritmos começa com “the BLACK seminole”, em uma das diversas parcerias com a cantora Diana Gordon que estão no álbum. À primeira vista, a música poderia muito bem ser confundida com qualquer uma do Pink Floyd em The Dark Side of the Moon, algo impensável quando olhamos a carreira de Yachty no passado.

Em seguida, “the ride” contém outra parceria, agora com o rapper Teezo Touchdown. Na faixa, Yachty mostra uma personalidade mais séria nos seus versos do que em sucessos de trabalhos anteriores, quando o mesmo reflete sobre a estratificação social a partir do ponto de vista de um homem preto que ascende como artista.

“running out of time” mostra o lado romântico de Lil Yachty quando, em conjunto com a cantora Justine Skye, canta sobre a tentativa de convencer um amante a permanecer ao seu lado. Destaque aqui pro refrão, “Run out/running out of time”, que acaba pegando demais o ouvinte. A faixa começa a desacelerar a vibe do álbum, e até por isso, “pRETTy” é perfeita pra vir na sequência por continuar nessa linha.

Voltando à frase de Bob Ross que citei no início da resenha, nada resume tanto ela no próprio disco quanto “failure”. Nela, Yachty monologa sobre o fracasso e sobre como podemos aprender e nos tornarmos melhor com ele. Pra além do que é dito, é preciso enaltecer o instrumental, assinado por Alex G e Mac DeMarco.

As coisas voltam a ficar mais coloridas em “THE zone~”, ao menos no instrumental, que lembra muito “Currents” do Tame Impala. Na canção, Yachty aborda a sensação de pertencimento e da falta de, como nos versos “I’m stuck in a zone/And I’m a million miles from”. “WE SAW THE SUN!” sampleia Bob Ross e finalmente deixa tudo mais claro quanto a questão da persistência e erro serem um tópico considerado no disco.

“drive ME crazy!” é a melhor faixa de Let’s Start Here por ser a que, dentro desse universo único, é a que mais foge de algo que poderia vir de Lil Yachty. Além disso, é um ótimo complemento pra “IVE OFFICIALLY LOST VISION!!!”, já que ambas puxam uma vibe que parece conceber uma trip de ácido. Por fim, em ambas vale exaltar a participação de Diana Gordon, que traz um brilhantismo a mais pros vocais. Aliás, a colaboração remete muito a que a mesma teve no disco Heaven to a Tortured Mind, do Yves Tumor.

E a parte final do álbum?

“sAy sOMETHINg” e “paint THE sky” não tem um fit tão bom com o restante do disco, e o registro tem uma queda de nível uma vez que se torna monótono e monotemático nesse momento. “sHOULD i B?” puxa um R&B que se mostra mais criativo do que as duas faixas anteriores, e a sonoridade é perfeita pra letra mais romântica. “The Alchemist.” faz com que o rapper se coloque como um alquimista em busca do elixir da vida – nesse caso, ser sempre lembrado por sua música.

Por fim, “REACT THE SUNSHINE.” confirma um trabalho com mais autorreflexão e sensibilidade, ainda mais com os vocais de Daniel Caesar, mesmo que a música em si também soe mais solta de Let’s Start Here, já que o álbum aposta pesado no rock.

Enfim, em meio a tentativa de se distanciar daquilo que catapultou sua carreira, Lil Yachty traz vários acidentes felizes com Let’s Start Here. Todavia, isso não é uma coisa ruim: os erros contidos no trabalho são resultados pela obsessão do rapper em trazer um disco de qualidade (definitivamente o melhor da sua carreira). Consequentemente, o artista demonstra alcançar novas sonoridades de forma coesa. Acima de tudo, Let’s Start Here é uma viagem – o tipo de viagem que todo artista deveria tentar.

Capa de Lets Start Here, álbum do Lil Yachty.

Lil Yachty – Let’s Start Here.

Lançamento: 27 de janeiro de 2023
Gravadora: Concrete, Motown e Quality Control
Gênero: Rap, R&B, Rock Psicodélico e Funk
Produção: Jake Portrait, Jam City, Justin Raisen, Lil Yachty, Magdalena Bay, Patrick Wimberly, SadPony e Teo Halm.

Faixas:
01. The Black Seminole
02. The Ride
03. Running Out of Time
04. Pretty
05. Failure
06. The Zone
07. We Saw the Sun!
08. Drive Me Crazy!
09. I’ve Officially Lost Vision!!!!
10. Say Something
11. Paint the Sky
12. Should I B?
13. The Alchemist
14. Reach the Sunshine