Entrevista realizada por Juan Youth.
Revisão por Juliana Vannucchi.
Não é exagero algum dizer que Dennis Sinned é uma das figuras mais icônicas do Pós-punk nacional, afinal, sua contribuição com essa cena é notavelmente ampla.
Com quinze anos de estrada, passagem por inúmeras bandas autorais e uma vasta experiência nos palcos e festivais, o músico carrega uma bagagem digna de respeito. As letras que escreve, geralmente possuem inspirações e abordagens políticas, sociais e filosóficas, e são permeadas por uma aura poética que deixa seus desabafos líricos profundos. Além disso, Dennis também tem um estúdio próprio em São Paulo, no qual trabalha com gravação e edição musical, colaborando com outros projetos além dos seus.
Para entender um pouco mais sobre a sua trajetória, que tal um papo bem interessante? Foi isso o que fizemos e você pode dar uma olhada no resultado logo abaixo.
Conte como você se introduziu na música, o que te fez ser um músico e o que te mantém ativo até hoje?
Ola! Primeiramente obrigado a todos pelo convite e pelo interesse no meu trabalho. Cara, meus pais erraram em umas coisas na minha educação (hahaha), mas com oito anos de idade eles fizeram a coisa mais acertada que poderiam ter feito na minha formação pessoal: eles me levaram pra uma escola de música e lá eu pude escolher um instrumento pra aprender. Meu primeiro instrumento foi um órgão, depois fui pro teclado eletrônico desses convencionais.
Comecei a tocar na noite fazendo música autoral em 2006 e não parei mais, formei bandas e participei de diversos projetos desde então. Sendo bem objetivo, eu faço música porque minha vida é uma merda, fazer música torna a minha vida menos uma merda… é meio que isso… é oque eu faço pra dar sentido.
Acredito que para cada banda/projeto que você fez existam influências diferentes, no entanto, sempre temos artistas em que nos baseamos desde sempre, quais são seus artistas preferidos de todos os tempos?
Gonzaguinha, The Clash, Legião Urbana…
Qual ou quais os shows mais memoráveis de sua carreira e porque?
Alguns sempre nos marcam, me lembro com muito carinho quando toquei num festival chamado Darktronic no Pelourinho, em Salvador, com a Days are Nights. Lembro dos shows do Segundo Inverno em São Thomé das Letras, no Festival Woodgothic… era muita loucura (risos).
Lembro quando abrimos o show do Diary Of Dreams no Cine Joia, em São Paulo. O público não tinha muito haver com a gente (Segundo Inverno) e não entendeu uma ironia minha no palco (ter que explicar ironia é foda risos). Teve uma parte da galera que nos vaiou, uns góticos mostraram o dedo pra mim (risos).
Teve um som uma vez lá pra 2008 num sobrado na Parada Inglesa na Zona Norte de SP, era literalmente uma casa, sem alvará de bar ou casa noturna pra funcionar, ali era uma balada gótica chamada Blackout, fizemos um som lá uma noite que foi magia pura… lembro que tocamos uma música do Ethiopia, aquela “minha vida em suas mãos”… foi bem louca essa noite, muita gente doida, esse pico logo foi “desmontado” acho que pela policia…
Como você compara o atual momento da sua carreira com os primeiros anos do seu trabalho?
Bom, como eu sou artista independente acho que tô começando a aprender a me produzir melhor, gravar melhor, mixar melhor. No começo eu tocava darkwave, era synth, bateria eletrônica e guitarra. Hoje tô fazendo um som mais “orgânico” – tem gente que não gosta desse termo (risos).
Agora com o meu trabalho solo, produzi também umas vídeo-poesias e um mini-doc sobre a produção do Id, ego, superego e outras porcarias, que foi o álbum de estreia do Dennis e o Cão da meia-noite. Tá cheio de web-vídeos e performances no meu Instagram, no canal do projeto e da Dissonância Magnética no Youtube. Resolvi ir pra essa onda de vídeo durante o período da pandemia, já que não tinha show, e faço um convite aos leitores para acessarem lá e conhecerem meu trabalho.
Você poderia nos indicar algumas bandas que estão surgindo na atual cena musical?
Eu escuto umas coisas meio fora de esquema, mas tô ouvindo muito Eliminadorzinho, Wagner Almeida, SLSD, Fernando Motta… tem o álbum novo de Post Punk do Baudelaire que já é banda veterana no ramo mas é sempre uma “banda nova”, Stenamina Boat (gravei e mixei um álbum deles) mas independente disso, gosto demais do trabalho dos caras. Tenho escutado muita música em espanhol, muito reggaeton então escutei muito Friolento, do Chile, e o Depresion Sonora, da Espanha.
No final do ano passado, você foi agredido na frente de um bar no qual iria se apresentar. A repercussão desse acontecimento foi imensa. Gostaria que você nos contasse como se sentiu nos primeiros dias vividos depois dessa noite.
Eu voltei do hospital e fui fazer BO e corpo de delito. No dia seguinte falei com algumas mídias antifascistas menores. Na segunda-feira essas mídias menores repercutiram e a noite fui comprar um celular que tinha sido destruído na agressão (valeu comunidade da plainsong e galera do grupo antifascista pela vaquinha). Carreguei o celular e na terça quando acordei eram dezenas de jornalistas mandando mensagem nas minhas redes sociais, uns advogados, grupos Punks e LGBTQIA+.
O caso ganhou alguma notoriedade, pois foi no dia da consciência negra e fez parte de uma série de outros atos que aconteceram aquele dia, como a bandeira colocada em uma ponte com a frase “orgulho branco não é crime”. Eu passei uns três ou quatro dias tentando me reorganizar, respondendo advogados e jornalistas e tentando entender quem sou eu no meio desse episódio todo que aconteceu, Agora tô tentando entender um pouco mais de Direito (risos).
Que cicatrizes essa experiência deixou em você?
Eu tô com síndrome de pânico e tive algumas crises desde quando aconteceu aquilo, mas tô tentando levar minha vida. Percebo que eu mudei em algumas coisas, tô mais ansioso e compulsivo. Isso tudo a gente trata, o que a gente não pode é parar de viver por causa de uns caras merda como esses, né?
De que maneira podemos combater esse tipo de intolerância ideológica? Você consegue imaginar um mundo sem violência?
Não consigo imaginar o mundo sem violência. Somos colocados e retirados do mundo de forma violenta. Esse “pacto social” é violento, a distribuição de renda e cultura é injusta, as relações de poder estão em tudo… na política, na música, no futebol. Existe uma cultura da violência e ela é uma válvula de escape muitas vezes…
Acredito que uma forma de amenizar esse “vir ao mundo violento” seria promovendo de alguma maneira políticas de igualdade social. O processo é lento… mas é por aí…
De que maneira você descreve o mundo “pós-pandêmico” em que vivemos?
Eu acho que estamos vivendo a falência das relações humanas, ou pelo menos dos valores que ela representava, eu nasci em 1983 e me lembro do mundo sem celulares e internet, sem essa cultura da informação rápida… Isso mudou demais a forma das pessoas se relacionarem. O período pandêmico corroborou esse novo momento das relações humanas, mais frias e distantes. Talvez tenha virado uma necessidade pra sobreviver nesse mundo individualista.
Dennis, se você pudesse fazer um único desejo para se realizar em 2022, o que pediria?
Maior coerência entre discurso e prática.