No meu dia-a-dia, praticamente só uso camisetas de bandas. Acredite, em meu guarda-roupa tem de tudo: várias dos Banshees, algumas do Bowie, The Who, The Cult, The Cramps, Black Sabbath, Velvet Underground e inúmeras outras. É uma paixão minha!
Justamente por ter esse hábito, sempre que vejo outra pessoa também usando camiseta com imagem de banda e afins, imediatamente meus olhos são atraídos para a vestimenta – especialmente, é claro, se for de uma banda, músico ou álbum que eu aprecio.
Sempre que via as fotos de um certo amigo meu, reparava que ele vestia camisetas muito bonitas, com imagens extraordinárias de cantores, capas de álbuns e logotipos de bandas das quais nem sempre é fácil encontrar camisetas ou quaisquer outros acessórios – tipo Amoon Duul II e Modern Lovers. Em certa ocasião, comentei com ele sobre essa minha admiração por suas camisetas, e foi então que, muito felizmente, ele explicou que eram peças personalizadas e indicou (não sem antes elogiar muito) o trabalho de seu amigo Ary Vianna. E aí estava a origem das camisetas legais que ele tinha, e que eu sempre admirava.
É claro que de imediato já me interessei em conhecer melhor os trabalhos do artista que o rapaz das camisetas legais havia indicado. Adicionei o Vianna no Facebook, e fui acompanhando através fotos um pouco de sua trajetória.
Percebi então que muitos aspectos dos trabalhos artísticos produzidos por ele me fascinavam e, em certo momento, notei que gostaria de conhecê-lo melhor para tentar entender um pouco mais do estado de espírito que se encontrava por trás daquelas lindas linhas estéticas, moldadas, hora em cima dos traços coloridos da Pop-Art, e hora das linhas caóticas do universo underground. Por isso, convido os leitores para conhecerem uma face do mundo de Vianna que eu consegui desvendar, e pela qual tenho enorme respeito e apreço (também pela qual me identifico, diga-se de passagem).
Primeiramente, é preciso reconhecer suas notáveis habilidades, pois ele é um artista versátil, capaz de pintar imagens diferentes, de temas diversos e em vários tipos de objetos, tal como vinil, tecido e quadro. Tudo isso começou quando ainda era garoto e sua primeira experiência com a pintura em tecido foi um desenho do Paul Stanley que fez numa camiseta, para um colega de escola.
Vianna ficou satisfeito com o resultado final desse seu primeiro registro numa camiseta. Porém, embora nesse ponto a arte tivesse se tornado sua parceira íntima e aliada eterna, a vida seguiu rumos distintos durante um período de tempo, até que em meados de 2007, por forte influência e incentivo de amigos, Vianna tomou a decisão de se dedicar de vez ao seu talento artístico e levar suas produções “mais a sério”, conforme suas próprias palavras. Nessa época, ele fez um trabalho para uma banda de São Paulo usar como pano de fundo numa apresentação feita em Jundiaí, cidade onde Vianna reside. Esse trabalho foi bem aceito e recebeu muitos elogios, fatos que o incentivaram ainda mais a trilhar seu almejado caminho artístico. Motivado pelo reconhecimento que obteve, nessa época chegou a abrir sua própria loja, embora infelizmente, hoje em dia ela esteja fechada e ele só venda suas peças pela internet.
Mas, apesar de obter certo reconhecimento por seus feitos, Vianna carregava em si um impulso artístico underground que o afastava de vertentes tradicionais e óbvias. Não nutria grande interesse em retratar paisagens locais ou pintar telas de natureza morta. Sua alma vibrava e se inspirava com outras fontes. “Minha atenção se voltava para aspectos mais decadentes da realidade, tal como a dependência de droga, o suicídio e acidentes trágicos. São elementos que alguns músicos retrataram e esse lado mais trágico da existência me atrai bastante”, revela.
De fato, grandes artistas se voltaram para aquilo que estava além do óbvio e a margem das expectativas da indústria. Alguns músicos que fizeram isso, que Vianna aprecia e que acredito que sejam dignos de menção, foram Lou Reed, com seus poéticos gritos de liberdade; Johnny Thunders, com seus ruídos cativantes; Iggy Pop, com sua música versátil e agressiva; o sublime Peter Murphy e o ousado e barulhento Lux Interior.
Particularmente também tenho enorme apreço por esses grandes gênios que foram originais o suficiente para arrebentar as correntes das suas épocas e se lançarem no absurdo de suas existências. Acredito que a vida de Vianna mescle um pouco daquilo que cada um desses músicos nos deixou como essência, como legado e, justamente por isso, Vianna não se enquadra nos padrões óbvios da existência, naquilo que a massa propõe e expõe – essa é uma característica típica de um verdadeiro artista: sempre buscar algo além daquilo que a maioria produz.
É interessante notar que a arte que Vianna cria é motivada e articulada pela própria arte. Ou seja, uma das maiores inspirações do artista de Jundiaí é o trabalho de grandes músicos e bandas, especialmente daqueles que, de alguma maneira, foram outsiders que se sobressaíram em seus tempos. Ele se sente confortável enquanto pinta mas, para o momento ser ideal e que renda mais, é preciso que esteja escutando música. Em paralelo a essa fonte da qual Vianna extrai suas ideias, há também sua visão niilista de encarar o mundo e viver a realidade: para ele, não há sonhos, não existem expectativas. Não há consistências nessa jornada na qual a incerteza impera e “Deus está morto”. Mas nada disso impede que ele se movimente, que simplesmente “cruze os braços” diante da vida – muito pelo contrário, seu impulso niilista é justamente o que o move e que, em partes, o faz encontrar conforto através de suas pinturas.
O resultado de sua trajetória e de seus gostos se manifestam em telas, vinis e camisetas com cores cujas tonalidades geralmente são vibrantes e chamativas. Eu gosto muito das pinturas que ele faz baseadas na Pop-Art, seguindo aquela estética clássica de Andy Warhol. Suas reproduções são sempre perfeitas e encantadoras, construídas com traços caprichosos e uma poética combinação de cores, feitas por quem realmente ama, entende e sente a arte. Os trabalhos, sem economizar elogios, são impecáveis. Os que mais me atraem sãos os vinis de bandas, que acho deslumbrantes. É como se ele realmente captasse a real aura daquilo que retrata e provavelmente ele consegue, de fato, captar.
Não resta dúvida de que no atual contexto em que o Brasil se encontra, viver de arte não é uma tarefa fácil (de Filosofia também não, diga-se de passagem… e já dizia um certo gênio alemão que o filósofo é irmão do artista, certamente não disseram isso a toa). Mas Vianna tem sido corajoso e persistente, se entregou ao seu talento e está construindo sua vida por intermédio de sua grande paixão, que é a pintura. É preciso encarar as dificuldades que surgem, pois sabemos que viver não é tarefa fácil. O constante valor por suas produções e reconhecimento do trabalho por parte de seus apreciadores é grande e frequente, e ele considera que seja algo imensa, e suficientemente gratificante. Não à toa, nosso artista vende telas não apenas para vários estados do Brasil, mas também para outros países. Sucesso ao Vianna, um brinde à arte e ao caótico mundo underground!
“Sem a música, a vida seria um erro“. – Nietzsche.
E para encerrar, confira uma playlist especial que criei com o Ary. Inicialmente cada um de nós tinham incontáveis músicas em mente, todas de vertentes bem diversificadas do Rock And Roll. Decidimos estreitar, partindo de raízes do Glam e do Protopunk, que se desdobram no Punk Rock, passeiam pela No Wave norte-americana, deságuam em clássicos do Pós-Punk e, por fim, alcançam algumas bandas mais novas. Foi desafiador estreitar tanto, já que ambos amam tantas bandas e músicos variados… mas a qualidade está garantida! Dá pra chacoalhar a cabeça em qualquer lugar, e pirar debaixo do chuveiro, então aumente o volume e aperte e o play!